10 de fevereiro de 2012

‘O vendedor de passados’ vira um filme sobre o amor contemporâneo

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PAULÍNIA - Mesmo sem a pirotecnia científica de "Brilho eterno de uma mente sem lembranças" (2004), existe um quê do cult de Michel Gondry em "O vendedor de passados", produção de R$ 5 milhões que Lula Buarque de Hollanda filma neste momento com base no romance homônimo do angolano José Eduardo Agualusa. As filmagens começaram em janeiro em Paulínia e arredores e amanhã mudam-se para o Rio de Janeiro, onde a trama é ambientada. Centrados na memória, tema fundamental do cinema contemporâneo, os dois filmes falam de pessoas em luta para deixar as recordações para trás e alcançar a liberdade de recriar suas próprias histórias.
No livro de Agualusa, há um olhar sobre Angola que traz em si uma crítica política. Mas não tem nada de África aqui. Ao importar a trama para o Brasil, queria partir dela para entender o que é o amor contemporâneo tendo como base a história de uma pessoa que, por uma série de razões, poderia precisar de um passado novo — diz Lula, realizador de "Casseta & Planeta: A taça do mundo é nossa" (2003).
No "Brilho eterno..." de Buarque, sua Kate Winslet é Alinne Moraes, no papel de Clara, jovem de identidade misteriosa que encomenda "memórias" a um especialista em forjar passados, Vicente, interpretado por Lázaro Ramos.
Eu entendo o filme do Lula como a história de dois mentirosos que se encontram na verdade — explica Alinne.

No sábado, num casarão em Sousas, distrito de Campinas, Lázaro e Alinne rodaram as sequências em que Clara testa pela primeira vez o passado que Vicente vendeu a ela durante um jantar com o casal Jairo (Odilon Wagner) e Stella (Mayana Neiva).
Pessoas magoadas com a vida precisam mudar suas histórias. Nosso filme revela o quanto a mágoa aprisiona e quanto construímos passados em nossas relações — diz Odilon, cujo personagem, um cirurgião plástico acostumado a reconstruir o corpo de pessoas incomodadas com a própria forma, ocupa o lugar da figura paterna que Vicente perdeu.
Como preparador de elenco, Buarque convocou Gustavo Machado, premiado pelo filme "Olho de boi" (2007).
Meu papel aqui é estimular os atores a deixarem a intuição fluir — diz Machado
Confiando a Toca Seabra (de "O invasor") o posto de diretor de fotografia, Buarque importa para seu novo longa elementos de sua experiência com o cinema documental ao delinear a mecânica de trabalho de Vicente. Seu "vendedor de passados" usa vídeo e fotos para inventar uma vida hipotética para seus clientes
Meu barato com o cinema é viajar no tempo. Aqui, a questão é fazer um filme contemporâneo, sobre este mundo do pós-pós-tudo em que a gente vive — diz o diretor, sócio-fundador da Conspiração Filmes.
Segundo Buarque, o desafio de "O vendedor de passados" é mostrar que um filme sobre a contemporaneidade, para além de gêneros como comédia, favela movie, drama e etc., pode se comunicar com o público.
Os argentinos conseguiram isso: um filme como "Um conto chinês" ultrapassar dois milhões de pagantes na Argentina. O cinema na América Latina ficou muito preso à questão social. Agora, com o desenvolvimento econômico, o cinema começa a ver além e testar outros modos de se fazer um filme de hoje, sobre o hoje — diz o diretor.
Fora da ficção, Buarque passou por projetos antropológicos como "Pierre Fatumbi Verger: mensageiro entre dois mundos" (2000) e fez uma série de projetos musicais como o vídeo "Gilberto Gil: Tempo rei" (2002) e o longa "O mistério do samba" (2008), codirigido por Carolina Jabor sobre a Velha Guarda da Portela. Um de seus entrevistados, o compositor Monarco assina a canção-chave da trilha sonora de "O vendedor de passados", gravada por Marcelo D2.
Filmei muitos projetos ligados à música, vários com o Gil. Com 49 anos, eu venho da geração dos herdeiros do tropicalistas. Gil e Caetano são meus filósofos culturais, que enxergaram a evolução deste país a partir da mistura de raças — diz o diretor, que foi estagiário de Joaquim Pedro de Andrade (1932–1988) no projeto "Casa grande & senzala", jamais filmado.

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