Pelo reflexo dos espelhos, é possível enxergar uma Alinne Moraes segura de si, que sabe valorizar bem os atributos que tem: o olhar penetrante, o maxilar bem marcado no rosto anguloso e os lábios carnudos, que a fizeram ter uma das bocas mais famosas do país. A atriz já chegou prontíssima para a sessão de fotos desta edição. Conseguiu, em poucos cliques, as ótimas fotos que estão nesta reportagem. Isso vem da experiência como modelo, carreira em que investiu dos 12 aos 18 anos, mas também do estilo com que leva sua vida:
— Sempre fui muito prática. Acho que é minha maior qualidade.
Bem capricorniana.
— Eu lembro que, quando criança, brincava comigo mesma e vivia me olhando na penteadeira da minha avó. Ficava ora forçando choro, ora rindo, ora observando meu corpo, como se tentasse me conhecer. Engraçado como isso faz o link com o fato de ter virado atriz, aos 17 anos — relembra.
Também foi se admirando no espelho que a jovem adolescente de Sorocaba, no interior do estado de São Paulo, mesmo com o bullying que sofria na escola, enxergou a própria beleza:
— Me chamavam de cabo de vassoura, cotonete, bocão Royal, mas eu não acreditava no que diziam. Lá no fundo eu não me desgostava. Eu era legal comigo nesse aspecto.
O reconhecimento tem a ver mesmo é com aceitação e está longe de ser só vaidade. Esse último sentimento, a atriz enxerga mais em Isabel, sua personagem em “Espelho da vida”. A vilã faz tudo para conseguir o que quer apenas pelo prazer de mostrar que está certa. Um exemplo claro é a relação dela com Alain (João Vicente de Castro).
— Acredito que Isabel não ama Alain de verdade. O que ela ama é a posse, a sedução e mostrar que ele não a esqueceu. O que leva as pessoas a confundirem um pouco, né? Tudo na vida é interesse. Seja amoroso, profissional... Isabel espera que ele proporcione a ela riqueza e novas experiências, como ir para o Rio de Janeiro. É um amor meio doentio por essa vaidade — acredita a atriz.
A teoria de Alinne ganha força se analisarmos o passado da personagem. No início da vida adulta, Isabel ia fugir com Felipe (Patrick Sampaio), mesmo de casamento marcado com Alain, por julgar que o affair teria mais oportunidades na vida. Um caso clássico de traição, como esse, tem perdão?
— Eu acredito em poucas regras. Tudo na vida é possível perdoar. E reconstruir a relação também é possível. Eu já traí quando era muito jovem, devia ter meus 15 anos, mas ainda nem sabia o que era namoro. Acho que traição é uma coisa que vai do caráter. É como roubar. Se você está bem com coisas que são erradas, isso é quase uma sociopatia — afirma a atriz.
A vilã da novela das seis se humaniza quando o assunto é Priscila (Clara Galinari), sua filha. De um jeito meio torto, dá para ver que Isabel a ama e a preocupação é real, como foi quando a garota se perdeu numa gruta em Rosa Branca:
— Talvez porque Isabel enxergue Priscila como o próprio umbigo, como se elas fossem a mesma pessoa. Tem muitas mães que fazem isso (risos).
Mas Alinne garante ser bem diferente com Pedro, seu filho de 4 anos, fruto do relacionamento de seis anos com o cineasta Mauro Lima:
— Eu sou um pouco tensa como mãe. Hoje até estou mais relaxada, mas pensei que fosse ser mais tranquila. A gente diz que não vai repetir as mesmas coisas que nossas mães faziam, mas somos muito parecidas com outras mulheres. Viemos do mesmo saquinho. É tudo tão surpreendente no momento em que acontece que a gente se pega errando e aprendendo com nossos filhos.
A atriz faz até piada com seu próprio jeito de ser. Levanta do sofá no meio da entrevista, finge correr atrás do filho (“Ai, ele vai bater a cabeça ali”, reproduz) só para mostrar que é o tipo de mãe que está sempre tentando prever o próximo tombo da criança:
— Minhas amigas que estão no segundo, terceiro filho, vejo que elas são mais relaxadas. E eu prevejo coisas erradíssimas (risos). Depois, fico pensando: “Caramba, eu tenho que deixar o bichinho mais solto”. Ele precisa cair. A vida vai dar cada tapa na cara dele! Uma vez a babá estava ninando o Pedro, e, quando eu vi aquilo, pedi para ela não chacoalhá-lo tanto. Meu Deus, logo pedi desculpas! Ela não estava fazendo nada demais. É essa tensão de que ninguém sabe cuidar melhor que a gente. Nos tornamos essa coisa meio chata, meio mãe.
E como toda boa mãe ela mostra que não se desliga da família em momento algum. A própria sessão de fotos e a entrevista vieram com horas contadas, logo justificadas por ela: “Meu filho está de férias, meu marido está fora…”.
— O pessoal já me conhece. Em cena, num intervalinho, tiro o celular, olho rapidinho, e estou falando com a babá o tempo todo. Ontem pedi daqui mesmo (dos Estúdios Globo) uns salgadinhos por aplicativo para entregarem lá em casa, porque o Pedro estava recebendo os amiguinhos. Não consigo largar, mas também não sofro. Sofreria se fosse obrigada a não tocar no celular, não estar presente — garante.
Após alguns segundos em silêncio, a atriz — que foi criada a vida toda pela mãe (Ana Dorelli) e pela avó (Maria Dorelli) e que conheceu o pai (Luís Orlando) apenas aos 22 anos — reflete sobre seu comportamento:
— Talvez se tivesse tido uma família mais óbvia do comercial de margarina eu fosse um “pouquito” mais segura. Acho que acabo dando amor em excesso. Quem sabe eu não possa dividir esse sentimento? — diz em um tom melódico, mas descartando aumentar a família por agora: — Minha mãe foi filha única. Eu também. Então, nesse momento, só o Pedro está muito bom. No futuro, quem sabe? É que é uma gravidez muito recente. Agora que eu voltei a namorar e trabalhar mais tranquilamente.
Sobre a criação, Alinne não esconde a infância simples. Mas, discreta, não gosta de contar histórias tristes (”Nunca quis participar nem do ‘Arquivo confidencial’. É muita exposição”, diz). Tanto que, no início da fama, irritou-se ao ver uma vida que nem ela conhecia direito escancarada nas bancas numa capa de revista:
— Quando fiz a Clara de “Mulheres apaixonadas” (2003) e estava aquele “boom”, eu dei uma entrevista sobre meu trabalho, como estou fazendo aqui, até que a jornalista perguntou o nome do meu pai. Eu disse, mas ainda não sabia nada sobre ele. Duas semanas depois, vi na capa: “Alinne Moraes e sua história surpreendente”. Ligaram para o meu pai e ele deu uma entrevista sobre como foi a vida dele com minha mãe e o que tinha acontecido. Tinha coisas ali naquelas páginas que as pessoas ficaram sabendo antes de eu saber. Eu me senti estuprada. Roubaram minha história.
O tempo e o reconhecimento como atriz a reaproximaram da imprensa. Hoje ela até interpreta uma jornalista na trama das seis (e a personagem é do tipo que inventa notas maldosas que desagradam a qualquer um).
— A retomada foi o foco no meu trabalho. A vida me deu a oportunidade de conhecer e mostrar a minha vocação. Daí veio o respeito. Não faço planejamento com assessoria de imprensa para divulgar minha vida. Só quero fazer um bom personagem que fale por si só — diz.
O planejamento só existe se for para ficar mais tempo com a família:
— Quando jovem, tinha mais aquilo de “agora vou fazer teatro, agora não sei o que…”. Hoje faço cada vez menos planos. Eu quero sempre ter bons papéis, e não é por vaidade. Mas é que boas histórias nos fazem pensar, a arte ensina. Ao mesmo tempo, depois de ter filho, só quero fazer meu trabalho bem feito, voltar para casa e viver minha vida. Lá é onde eu mais gosto de estar.
Como as externas de “Espelho da vida” são gravadas em três cidades de Minas Gerais, uma vez por mês o elenco viaja. Para não ficar tão distante de casa, Alinne negociou com a produção e a direção da novela um esquema bate-e-volta. Fica dois dias, volta para o Rio de Janeiro por mais dois ou três e volta para finalizar as cenas.
— E os dois dias em que volto para o Rio eles me colocam em estúdio. É só para ficar em casa um pouquinho, de manhã tomar um café e colocar o Pedro para dormir. É rápido, mas já vale a pena. Mesmo sendo sete horas de viagem, assim eu sempre volto 100% — diz a mãezona.
Saber quem Alinne Moraes foi em outra vida para fazer um paralelo, como Dora e Isabel em “Espelho da vida”, fica difícil... Mas pedimos para que a atriz comparasse pensamentos de hoje com os que que tinha quando estreou na TV.
“Em 2002, achava que seria só mais um trabalho como modelo. Hoje, enxergo como uma responsabilidade gigantesca”.
Fazer terapia
“Fazia para entender tudo o que me faltava, principalmente na infância. Atualmente, não faço mais. Mas faria por ter me tornado mãe. Eu me tornei outra pessoa que ainda está se conhecendo”.
“Não tinha medo de nada. Hoje, eu temo a morte. Como mãe, nasceu esse medo. Lembro que fazia cenas perigosas dispensando dublê. Hoje, se tenho que andar de carroça, já acho que os cavalos vão me jogar do precipício”.
Aparecer de biquíni na TV
“Nunca me senti bem. Deixa isso para as novinhas... E eu me vejo em fotos daquela época, achava meu corpo lindo, mas é algo meu não querer me expor assim. Isso me gera um desconforto”.
Ambição
“Queria fazer faculdade de Arquitetura. Voltei de Paris (onde morou quando era modelo) com essa intenção, mas aí tudo aconteceu, e eu virei atriz. Hoje, minha ambição é manter meu caminho, minha família em primeiro lugar e me aprofundar nesse amor diário”.
Reflexo(e)s
Espelho, espelho meu
“Eu diria para mim, na infância: ‘Calma, que sua vida está encaminhada’. Hoje vejo como tudo se encaixa perfeitamente”.
Em quem se espelha?
“Em minha mãe e minha avó, as grandes mulheres da minha vida. Profissionalmente, Fernanda Montenegro, Marília Pêra, Vera Holtz... Tive a oportunidade de trabalhar com elas. Sempre me deram toques legais”.
Espelho quebrado dá azar?
“Eu já tive muitas superstições. Hoje em dia, não tenho mais”.
Como em “Espelho da vida”, acredita em vidas passadas?
“Só não acredito porque já acreditei em tudo. Essa vida é a única certeza que tenho. E não tenho religião específica, mas creio em um Deus interno”.
Encarando os cachos na frente do espelho
“Para a novela, só uso um ativador de cachos e um difusor. E ele voltou a pegar toda essa textura. Estou bem feliz com ele natural e selvagem”.
Fotos: Vinícius Mochizuki
Assistente de fotografia: Rodrigo Rodrigues
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