6 de abril de 2008

Revista Marie Claire: Adoro ser má

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Edição 205 - Abr/08

A verdade é que odiamos gostar das vilãs da novela. Ainda mais quando elas são altas, curvilíneas, têm olhos claros, cabelos longos e parecem ter se encaixado ao papel. Só que aqui, Alinne Moraes, a malvada da vez, mostra algumas de suas fraquezas.


Por José Emilio Rondeau. Fotos: Sacha Höchstetter

Ela poderia passar por qualquer uma das incontáveis moças altas, bonitas e saudáveis que inundam as ruas da Zona Sul do Rio de Janeiro nas tardes de verão infernal: camiseta de manga cavada e short-saia pretos, óculos retangulares de grau, uma moldura avermelhada para olhos verdes, brincos quadrados (pequenos e discretos), sandálias de dedo, rabo de cavalo e clipe domando a juba e ocultando a franja.

Mas a ilusão dura pouco. A jovem mulher de dentes perfeitos, acomodada na varanda de um sobrado antigo de Botafogo, munida de cafezinho, água gelada e cigarros -que ela transporta numa elegante cigarreira prateada- não é qualquer moça. Longe disso.


Basta um pouco de atenção (e um pouco é mais que suficiente) para reconhecer o rosto que correu mundo nas capas das revistas e o corpo que apresentou coleções de moda nas passarelas de todo o planeta. E isso é apenas o que ficou no passado.

Hoje, ela é a dona da boca mais reconhecível da atual teledramaturgia brasileira e incorpora a detestada vilã da novela de Aguinaldo Silva, 'Duas Caras', uma personagem tão epicamente malvada que o autor apelidou de Fera da Barra -uma referência à Fera da Penha, a carioca que nos anos 60 matou a filha do namorado ao descobrir que ele era casado e pai de família.
Nesta tarde de quarta-feira, Alinne Moraes faz uma pausa breve na sua apertadíssima agenda de trabalho -são gravações de novela de segunda a sábado, geralmente do meio-dia às 21h, e o descanso no domingo pode ser atropelado por sessões de fotos, como aconteceu no fim de semana anterior, quando ela passou o dia inteiro posando para duas edições da 'Vanity Fair' italiana- para fazer aquilo de que menos gosta: falar de si mesma.

Eu queria sair e beijar sem ser observada'
Tenho uma dificuldade muito grande', diz, usando um sotaque elástico, flutuante, que mistura carioquês light com paulistano clássico, cultivado durante a infância e a adolescência passadas em Sorocaba, no interior de São Paulo, ao lado da mãe, professora, e da avó, benzedeira. 'Fico muito tímida, não consigo juntar as palavras, é muito engraçado. Suo! Tenho essa dificuldade. Eu sou tímida, de verdade. Hoje estou bem melhor, mas ainda é uma grande dificuldade.' Ela faz uma pausa difícil de não ser notada. 'Que eu trabalho.'



De fato, quando Alinne fala, parece se retesar. Ela pode sorrir, gesticular ocasionalmente seus braços musculosos, pode transmitir uma confortável afabilidade e uma simpatia genuína. Mas as frases -algumas aflorando em jorro desordenado, outras meticulosamente (inconscientemente?) editadas- saem com esforço. E são construídas com cuidado. Alinne não sabe o que vem pela frente. Não custa ficar em guarda.

O que é compreensível. Como ela mesma descreve, nos meses em que comparece à telinha, quase todos os dias da semana vive no olho do furacão. Bonita, famosa e realizada profissionalmente, passa o tempo todo na mira de revistas de fofoca em busca de um tropeção embaraçoso ou de alguma revelação suculenta sobre a vida amorosa da atriz. Por conta disso, para cada matéria publicada sobre o trabalho de Alinne -além das aparições na televisão e das campanhas publicitárias que estrela, sua elogiada estréia no teatro, encarnando Krishna, e seu primeiro filme, a comédia romântica 'Fica Comigo Esta Noite', lançado em 2006 -saem dez vezes mais fotos e notas sobre quem a acompanhou numa ida ao restaurante ou num passeio pelas ruas do Leblon, a zona conflagrada dos paparazzi cariocas. Os mais recentes mexericos nas revistas que lotam os balcões dos salões de beleza têm ligado Alinne a seu co-astro de telenovela, o ator Dalton Vigh. Ela diz estar solteira.

Alinne sorri com o espírito esportivo de quem conhece as regras do jogo. 'A gente vai se adaptando. Já cansei de brigar. Agora, estou sozinha e o que queria mesmo era poder viver como uma menina de 19 anos: sair, beijar na boca e não ter que dar satisfação.' Mas sabe que vida de celebridade não comporta momentos de anonimato. 'Eu brigava contra. Eu falava: 'Eles estão tentando me transformar numa personalidade! Eu não sou, sou uma pessoa normal!'. Tenho que me adaptar, e a melhor maneira é me proteger.'
Por isso, Alinne diz circunscrever as raras horas de ócio a partidas de tranca e 'um vinhozinho' com a amiga de infância Helena Lorensetti (atriz mais velha que ela e hoje também residente no Rio) e o irmão de seu empresário -namorado de Helena.

'Existe uma vilã que vive em mim'

Ela se expõe o mínimo possível, e o que permite ser visto, emocionalmente, é decorrência natural e direta do seu trabalho -ainda que filtrado pelas experiências pessoais. 'Quando você se esconde muito acaba se escondendo até de você. E meu trabalho como atriz é uma armadilha, tenho que me conhecer muito! Saber cada coisa, sem julgamento, para poder, a partir disso, criar um outro ser humano, sabe?' Assim, traz Sílvia, a Fera da Barra, à tona. 'Adoro ser má, mas não posso dar vida a uma vilã se não conheço a vilã que existe dentro de mim. Ela está aqui, só não opto por ela.'


De todo modo, estar na berlinda não é novidade. Nos tempos de escola, por causa da estatura e da sempre destacada boca, era 'alvo de tudo' na classe. 'Sempre fui muito alta. Então, sempre sentei no fundo, com os repetentes, todos meninos! Era Beição, Bocão Royal, todos os apelidos possíveis. Desde pequena, sabia que era fotogênica, mas, para eles, eu era o monstrinho da classe.'

Aquela que um dia já foi o monstrinho da classe hoje garante não ser refém do próprio equilíbrio estético. 'Não sou escrava da beleza. Para começar, eu vou envelhecer, sim! Como a Fernanda [Montenegro], como a Marília Pera, como muitas [atrizes] que eu admiro. Quando você tem uma certa idade, a maturidade e a inteligência falam mais alto. Principalmente para o ator. E, graças a Deus, a gente pode envelhecer nessa carreira. A gente pode estar com 90, 100 anos em cima do palco. Então, tem que aceitar isso. A gente tem que fazer papel de filha, de mãe, de avó, e para isso precisa contar histórias com que as pessoas se identifiquem. Elas precisam ter as rugas, precisam ter história de verdade. Senão, fica muito fake.





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