16 de maio de 2010

Entrevista para a Folha: Papel de tetraplégica deixa Alinne Moraes com marcas roxas pelo corpo

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Alinne Moraes, interpretando Luciana na novela "Viver a 
Vida".

A atriz Alinne Moraes, 27, passou a semana confinada nos estúdios da TV Globo, gravando os últimos capítulos da novela "Viver a Vida". Em entrevista à Folha, Moraes conta como foi seu aprendizado para interpretar a personagem tetraplégica Luciana na novela. A íntegra está disponível na coluna Mônica Bergamo deste domingo, para assinantes do jornal ou do UOL.





"Quando a Luciana sofreu o acidente, fiquei semanas gravando cenas sobre uma prancha de imobilização, em hospitais, parada numa cama. Era angustiante, doloroso. Cheguei a ficar deprimida, com partes do corpo roxas. Sou hiperativa e gravar com aqueles aparelhos todos no meu corpo [oxigênio, controlador de batimentos cardíacos] me deixava tensa", contou em entrevista ao repórter Jairo Marques, coordenador-assistente da Agência Folha. Cadeirante, Marques também autor do blog "Assim Como Você", da Folha Online.
Marques também entrevistou a jornalista santista Flávia Cintra, 37, que inspirou o autor da novela, Manoel Carlos, a criar a personagem Luciana na novela. Tetraplégica há vinte anos, depois de um acidente de carro, Cintra será uma das primeiras repórteres cadeirantes de uma grande rede de televisão; ela irá estrear hoje no "Fantástico", da Rede Globo.

FOLHA- Havia uma expectativa de que a sua personagem, Luciana, voltaria a andar.
ALINNE MORAES - As pessoas precisam entender que, se ela voltasse a andar, a gente iria frustrar milhares de pessoas com deficiência porque elas perderiam a identificação com a alegria e a forma de encarar a vida da personagem. Os cadeirantes são felizes, namoram, trabalham, curtem a vida, têm família. Só precisam de condições para fazer tudo isso.

FOLHA - As semelhanças dos gestos das mãos, dos ombros, caracterizados por você, impressionaram pela semelhança com os de um tetraplégico. Como foi seu aprendizado?ALINNE - O Jayme [Monjardim, diretor da novela] colocou para trabalhar comigo fisioterapeutas, terapeutas e médicos. Mas só quando conheci a Flávia Cintra [jornalista que inspirou Manoel Carlos] tive consciência de que cada pessoa com deficiência tem restrições físicas e maneiras de agir diferentes. Fui várias vezes à casa dela, em SP. Ela me ensinou tudo: como pentear os cabelos, como tomar banho, como tocar a cadeira de rodas. Ficamos extremamente ligadas. Mas teve um momento em que tive de romper o cordão umbilical e encontrar a Luciana. Ela era modelo, vaidosa, agitada. Tive de levar isso em consideração para compor os gestos.

FOLHA - Teve reflexos emocionais na sua vida fazendo a personagem?ALINNE - Não sabia que seria tão difícil, tão denso. Quando a Luciana sofreu o acidente, fiquei semanas gravando cenas sobre uma prancha de imobilização, em hospitais, parada numa cama. Era angustiante, doloroso. Cheguei a ficar deprimida, com partes do corpo roxas. Sou hiperativa e gravar com aqueles aparelhos todos no meu corpo [oxigênio, controlador de batimentos cardíacos] me deixava tensa. Fiquei nervosa e exausta com um monte de gente me tocando o tempo todo, com o elenco ao redor me dando força, com a dependência para fazer qualquer coisa. Não me deixavam sozinha nunca, tinham dó de mim naquela situação. E eu me sentia o Incrível Hulk, pronta para explodir (risos). Me relataram as mesmas sensações que um cadeirante sofre após um trauma.

FOLHA - Mudou a sua forma de ver um cadeirante?
ALINNE - Totalmente. Depois que você experimenta um processo de superação, entende que o mundo paralisou, que a cabeça de algumas pessoas também está paralisada por não enxergarem que é preciso ter acesso para todos, respeito às diferenças. Essa porta da acessibilidade tem de ser aberta com urgência. Há milhares de adolescentes, de jovens vivendo em cadeiras de rodas que não podem sair de casa porque a calçada é ruim, porque não há transporte de qualidade, porque não há rampas. Mas acredito que isso começou a mudar. As barreiras mais difíceis enfrentadas por um deficiente, porém, são as de atitude, de aceitação. Essas vão demorar mais para serem quebradas.

FOLHA - A sua personagem acabou ganhando mais destaque do que a Helena, da Taís Araújo. ALINNE - Desde o começo a própria Taís me disse que a Luciana seria uma personagem incrível, que teria muita repercussão. E vibrou comigo. Somos amigas. Ela viu primeiro do que eu que o papel era sensacional. Eu tinha medo de que fosse só sofrimento, tristeza. Não imaginei que a Luciana seria tão feliz, que conquistaria tanto as pessoas. Errei completamente.

FOLHA - A realidade financeira da Luciana contrastou com a da maioria dos deficientes no Brasil.
ALINNE - Por mais que ela tenha vivido uma realidade Pollyanna, ela mostrou que é possível sair de casa, mostrou que existem equipamentos que podem melhorar a qualidade de vida das pessoas. Pouca gente sabia que cadeirante poderia andar de bicicleta, a handbike, que tinha táxi acessível, que tem tecnologia para facilitar o dia a dia. A busca de informações na Globo por objetos que Luciana usava bateu recorde de ligações.

FOLHA - O ibope da novela não decolou como esperado.
ALINNE - A gente se sente realizada pela repercussão que o trabalho teve, pela emoção que causou nas nossas famílias e em nós mesmos, pela história da Luciana, que é inédita em uma novela. Todo mundo fala pra gente sobre as conquistas que "Viver a Vida" levou para os deficientes. Demos um grande passo para a inclusão no país.

FOLHA - A Luciana foi seu personagem mais importante?ALINNE - Com certeza. Tive um crescimento pessoal muito grande, no meu entendimento sobre a vida, na generosidade para levar o cotidiano. Aprendi a valorizar coisas simples que a gente deixa passar batido. É emocionante quando eu vejo uma criança com uma borboleta colada nas costas da cadeira de rodas, imitando a "Luciana".


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